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quarta-feira, 7 de julho de 2010

BATALHA PESSOAL DE THYAI


A espada estava reta e erguida com certa dificuldade pela sua mão direita. Ela tremia em alguns momentos, mas a mantinha firme juntamente com seu braço. A lâmina estava úmida com o sangue azulado da criatura que estava contra a parede de sobretudo preto e capuz que escondia os seus olhos, ou ao menos tentava, já que o branco salpicado de amarelo deles era nítido no escuro. A respiração de ambas as partes eram fortes. Seria possível ouvir até mesmo os batimentos pesados dos corações senão fossem as explosões de naves e tiros de fora do grande salão naquela noite. A guerra continuava. Mesmo que para eles dois havia dado certa trégua. A jovem que segurava a espada era Thyai, uma humana nascida no reino de Kadan. Piloto desde pequena que agora se via como um soldado. A criatura acuada era a que Thyai caçou por toda sua breve vida. Um Faile. Faile era a raça mais violenta de todo o sistema solar Jeru. Eles não eram sociáveis, e sua capacidade de batalha era temida por todos os reinos da Aliança, mas naquele momento a figura contra o fim da sala com uma única saída atrás de Thyai não parecia tão perigosa assim. Segurando sua arma, uma lança de duas pontas laminadas não parecia ter mais forças para lutar, aguardando somente os passos da jovem de cabelos cinza abaixo dos ombros.
Thyai trincava os dentes encarando-o, e em meio às explosões que tremiam as estruturas do local diz:
— Maldito! Você vai pagar pelo que fez!
O olhar de Thyai se perde por um breve momento. Um momento que ela não teve como se conter: Em sua memória surgia a imagem de uma casa num grande campo, com pastos e uma nave estacionada a frente. A vista era completa com um belo pôr dos sois. Ela, uma menina de oito anos de idade corria para ver seu pai que acabara de chegar da guarda real de Kadan, quando pôde ouvir os gritos. Primeiro saem correndo da casa seus dois irmãos, ensangüentado e mortalmente feridos. Um a um cai próximo a nave de seu pai. Depois sua mãe, e por ultimo um senhor com uma pistola nas mãos. Ele atirava, corria e com seu olhar procurava algo ou alguém. Quando avista Thyai, a coloca dentro da nave e programa para que saísse de lá. Segundos depois, tão rápidos que nem mesmo ela pôde perceber, dois Failes se aproximam e o matam cortando-o. O sangue espirra no painel da nave, e o sangue de seu pai foi tanto que escondeu a pequena garota atrás do vidro. O corpo sem vida cai sobre ele, podendo ser visto o ultimo olhar de seu pai. Ela, mesmo ainda muito jovem ver um dos failes arrancarem seu cordão, como barganha.
Ao retornar para a cena que a aguardava ela fixa seu olhar no cordão que a criatura carregava em seu pescoço, o mesmo de seu pai. Seu ódio aumenta, o sangue que escorria de sua testa e braços fazendo um rastro pelo caminho que havia seguido já não importava. Ela tinha a chance de se vingar, de fazer o que nenhuma outra criatura conseguiu fazer, ferir ou matar um Faile. A jovem carregava em seu pescoço um cordão semelhante, mas algo ainda faltava em sua vida, nem que fosse por um breve momento do que restara dela. Ela fixa seu olhar na criatura, que num lapso leve pôde perceber que a jovem esteve viajando em sua memória, e começou a observá-la mais.
— Tire o capuz! Vamos! — rosnou em palavras Thyai balançando nitidamente a espada.
O Faile bem devagar retirou o capuz com uma das mãos, e logo foi possível ver seu rosto. Sua pele escura, olhos amarelados e esporas saindo de sua pele como espinhos curvos para trás. Não era humano, mas uma coisa foi reconhecida por ela, se tratava de uma criança. Mesmo sendo um Faile era uma criança, foi possível perceber naquele momento.
E Thyai saiu da realidade novamente para sua memória sem poder ter muito controle. A casa era vista, a paisagem estava ainda mais linda e de relance ela poderia crer que estava vendo sua família viva, acenando para ela.
— Ainda não! — Gritou uma voz em sua memória.
Ela estava novamente frente à criatura acuada. E com um pouco de força sendo visível em seu olhar disse baixo:
— Uma criança?! Você é uma criança?
Ela sabia no seu íntimo que não mais conseguiria finalizar o que iniciou, não era como planejado, não havia sido ele quem matou sua família, com certeza seu pai, pois assim seguia a tradição de um Faile, mas ele não era o responsável direto. Thyai mesmo sabendo que ele nunca, jamais pensaria desta forma e que na primeira oportunidade a mataria não conseguiu pensar como um Faile, nem mesmo em seu mais puro ódio revelado.
A criatura havia percebido isso e quando a espada que estava direcionada para ele baixou apenas alguns centímetros, foi o tempo que ele teve para em dois movimentos retirar da mão da jovem e cortar a garganta dela até o peito. Ela não agüentou e com seu sangue jorrando em pulsar ao chão ela caiu para trás. O Faile andou por ela ainda visivelmente ferido, mas havia conseguido escapar da sua morte certa. A jovem não entraria na história de Jeru com tal proeza, nem mesmo se vingaria de sua família, assim era certo. Ele agachou-se, retirou seu cordão ensangüentado. Ela ainda com um ultimo movimento ergueu o braço para retirar o de seu pai que nele estava. O Faile parecia não se importar e permite que fique.
Neste momento as memórias voltam mais nítidas que antes, mas assim ela luta para voltar à sala escura e úmida de sangue.
— Ainda não! — bradou em sua memória tão alto que saiu em forma de palavras audíveis no salão.
Com bastante força ela retorna ao seu sangue que a sufocava. O Faile ao caminhar para a saída pára com um sinal dela, cuspindo o sangue da garganta.
— Espe...re. — conseguiu falar em meio a tanto sangue.
A criatura parou com seu olhar vazio e esperou. Thyai tirando de sua roupa um pequeno aparelho com uma luz verde piscando bem de leve o aperta. O cordão que outrora fora dela explode. O sangue azulado da criatura voa para cima de si. Os pedaços da capa e de seu corpo ficam espalhados por todo o lugar. Ela mal conseguia abrir os olhos com a sujeira que a encobria, mas novamente tentando falar ela diz:
— Agora... sim! — Ela volta para suas memórias que desta vez se confundia com a realidade. O sangue da sala, a espada, a capa e o Faile já não passavam de uma vaga lembrança. Ela correndo por detrás do monte perto da casa conseguia ver sua família tão próxima que não hesitou em gritar seus nomes. Chegando os abraçou e todos a receberam com grande felicidade, parecendo nunca ter existido um Faile, mortes, guerra, espada, explosões, naves, dor, ódio, desejo e sangue.

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